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"Vamos a banhos!" - Breve história dos trajes de banho
Museu Nacional do Traje e da Moda



Apresentação

 

A história dos trajes de banho e, nesta designação, incluem-se todos os trajes destinados a ocultar determinadas partes do corpo aquando das idas à praia, à piscina ou simplesmente à prática de desportos aquáticos, remonta há vários séculos. A evolução deste tipo de traje está intimamente ligada à evolução das mentalidades e ao conceito de exposição do próprio corpo ao olhar do outro. A colecção de traje de banho do Museu Nacional do Traje ilustra esta evolução, desde 1900 até à actualidade, onde é possível observar a crescente exibição do corpo - sempre associada às normas estéticas - e às imposições sociais e culturais de cada época.

Para entender todo o percurso percorrido até à actualidade, há que recuar à Antiguidade. Existem evidências arqueológicas de que neste período, as mulheres usavam o que terá sido algo semelhante ao actual biquíni. Frescos encontrados em Roma, mostram mulheres a usarem duas faixas de tecido a cobrir o peito e as ancas. Estas eram destinadas à prática desportiva e não aos banhos, pois, nessa época os habituais banhos públicos eram tomados com o corpo desnudado. De igual forma, na Grécia, as mulheres usavam duas peças de dimensões reduzidas exclusivamente para a prática do desporto.

Após este período histórico, há poucos achados arqueológicos ou relatos que nos contam como, ou de que forma, o corpo foi coberto nos banhos, públicos ou outros. Na Idade Média a prática dos banhos foi quase inexistente pois, quer os banhos de mar quer os de águas termais, eram tidos como nefastos para a saúde uma vez que se pensava que podiam ser focos de pragas e responsáveis pela propagação da peste. Os benefícios da água e do prazer de imergir o corpo na água, só foi redescoberto no século XVIII, onde as pessoas se banhavam em camisa comprida, sendo utilizadas muitas vezes as camisas de traje interior.

Contudo, foi somente com a Revolução Industrial que o banho se tornou novamente uma prática comum, nomeadamente o banho de mar. Em Inglaterra, com a nova rede de caminhos-de-ferro, houve uma maior mobilidade e as pessoas deslocavam-se para a costa para desfrutarem de passeios à beira-mar. Em França, em 1850, a aristocracia também descobriu o gosto pela natação e pelas praias da Normandia. Em Portugal, no final do século XIX, cresceu igualmente o gosto pela beira-mar, facilitado pela longa faixa costeira nacional, pelo que os trajes tiveram de se adaptar às mudanças do novo tipo de práticas de lazer e ao novo hábito de “ir a banhos”. Esta expressão surgiu associada ao hábito de passar férias na praia, costume inovador do Rei D. Carlos e da Família Real.

Estes fenómenos fizeram surgir em muitos países um tipo específico de traje de banho, executado em tecido de lã que, nalguns casos, poderia ser formado por seis peças: calças, camisa larga e comprida, cinto, touca, meias e sapatos. Estes trajes de banho ganharam finalmente a designação de “fatos de banho” e mais do que privilegiar o conforto ou a higiene, tinham como objectivo ocultar o corpo. Expô-lo era um sinal de pouco decoro e um atrevimento, geralmente associado às prostitutas. Até mesmo o bronzeado estava conotado com os camponeses e as pessoas de menos recursos que tinham de trabalhar ao sol.

Esta necessidade de esconder o corpo, levou a que se criassem nas praias “cabines de banho” móveis, uma espécie de casas de madeira sobre rodas, que eram arrastadas por banheiros, ou até por cavalos, até ao mar para as senhoras entrarem directamente na água, longe dos olhares curiosos. Eram depois novamente puxadas para o areal, após o banho de mar, onde serviam de vestiário para a troca de roupa numa maior intimidade. As idas à praia eram morosas, requerendo tempo para as trocas de traje e apenas serviam para as pessoas se banharem e não propriamente para nadarem.

No início do século XX, à medida que se tornaram mais habituais, os fatos de banho foram-se aligeirando. Os médicos e os higienistas aconselhavam o uso de fatos de banho folgados, de tecido de lã e o uso de chapéu ou touca. Às mulheres estava reservado o uso do fato de banho de duas peças, calças até abaixo do joelho e camisa comprida e larga e, aos homens, foi-lhes gradualmente permitido desnudar os braços, mas não o tronco, sob pena de serem multados por atentado ao pudor. São justamente deste período, os fatos de banho femininos mais antigos que o Museu possui no seu acervo. Executados em tecido de lã, habitualmente azul escura, são compostos por várias peças e têm em comum o facto de protegerem o corpo quase na sua totalidade. São guarnecidos com tiras de tecido de cor contrastante, geralmente branco, de inspiração náutica do traje de marinheiro.

Mesmo sendo o fato de banho largo de lã o modelo adoptado em praticamente todos os países, há uma grande inovação na forma e no material que, à época, chocou a mentalidade da sociedade dos E.U.A., mas que, inversamente, conquistou a Europa. Em 1907, a nadadora e actriz australiana Annette Kellerman, causou enorme furor ao surgir com um fato de banho de uma única peça, executado em malha, justo ao corpo, combinado com uns collants opacos. O escândalo foi imediato por esta peça ser muito reveladora das formas femininas e valeu-lhe uma multa por “atentado aos costumes”. No entanto, Annette apenas pretendia que as mulheres pudessem ter os movimentos livres para a prática da natação, o que não era possível com o modelo largo de lã que, uma vez dentro de água, se tornava pesado e desconfortável.

Esta “ousadia” foi a grande impulsionadora da mudança que ocorreu no traje de banho e, a partir desse momento, era irreversível o caminho que o fato de banho teria no futuro. Coco Chanel, em 1920, lança a moda da pele bronzeada que acaba por ser um incentivo para as mulheres começarem a desnudar os braços, as pernas e os ombros. Era o início da emancipação das mulheres, associada aos cabelos curtos, à subida da linha da bainha dos vestidos e a uma liberdade social e cultural. Alguns dos fatos de banho deste período que podemos observar na colecção, eram executados em tecido de algodão, ou malha grossa, uma matéria muito absorvente e pouco prática, que demorava a secar.

Os fatos de banho de malha elástica, uma inovação de Carl Jantzen e cuja marca é o seu apelido, tornam-se nesta década e nas seguintes cada vez mais populares e não cessaram de fazer furor. Existem na colecção do Museu alguns exemplares executados nesta malha, nomeadamente calções masculinos, e cujo logótipo representa uma nadadora a mergulhar com um fato de banho e touca vermelhos. Outra marca representada nalgumas peças é a “Segom”, cujos modelos são também de malha elástica e o logótipo é representando igualmente por uma nadadora trajada de vermelho sobre uma bóia. Alguns destes exemplares são ilustrativos do desnudar do corpo masculino, uma vez que a trousse (camisola de alças em malha, geralmente branca) caiu em desuso, o que permitiu aos homens exibir o tronco.

O ano de 1932, marca aquele que será o momento da grande viragem na forma do fato de banho feminino: a criação pelo costureiro francês, Jacques Heim, de um modelo de duas peças separadas, uma parte superior que tapava o peito e umas cuecas altas, de cintura subida, que tapavam o umbigo. Esta criação veio, mais uma vez, dar início a uma revolução de mentalidades. Alguns anos mais tarde, Jacques Heim, relançou estas duas peças com o nome de “Atome” (átomo) anunciando que era o “fato de banho mais pequeno do mundo”. Este tipo de fato de banho popularizou-se na década de 1940 e foi amplamente exibido por actrizes e pin-ups.

Contudo, estaria reservado a Louis Réard a verdadeira criação daquilo que hoje é o biquíni. Dono de uma boutique de lingerie em Paris, Louis Réard observou as mulheres na praia e constatou que enrolavam a parte inferior do traje de banho para poderem ter um bronzeado mais homogéneo e optimizado. Apesar da ideia não ser nova, criou um conjunto de duas peças cuja parte superior era semelhante àquela criada por Jacques Heim, mas reduziu a parte inferior a dois simples triângulos de tecido unidos por finos cordões fazendo com que a mulher exibisse o umbigo, os quadris e as nádegas. Este, sim, foi o momento do grande escândalo.

Esta peça, verdadeiramente revolucionária, foi lançada a 5 Julho de 1946, em Paris, com o nome de “Biquíni”. A escolha do nome era uma referência ao Atol de Bikini, nas Ilhas Marshall, no Oceano Pacífico, onde dias antes tinham ocorrido ensaios nucleares. O intuito era associar a peça a uma verdadeira explosão, sobretudo daqueles que a viam. Para mostrar ao mundo a sua criação, Louis Réard teve sérias dificuldades em encontar uma manequim que o vestisse. Recorreu então a uma dançarina do Casino de Paris, Micheline Bernardini, que posou com a peça explosiva na Piscina Molitor, em Paris. O biquíni era comercializado numa pequena caixa de fósforos, para ilustrar o seu reduzido tamanho, com o slogan “O Bikini, a primeira bomba anatómica”.

O choque cultural foi imenso e o biquíni não foi facilmente aceite pelas autoridades religiosas e morais da época. Proibido inicialmente em muitas praias de Itália, Espanha ou França por ser demasiado escandaloso, foi finalmente aceite nas praias espanholas em 1952 e depois, já nos anos 60, generalizou-se por toda a Europa. A década de 1960 marca assim a adesão irreversível a este tipo de peça. No entanto, apesar de ter ganho popularidade, não era tão revelador como o biquíni apresentado por Louis Réard. A parte do soutien era armada e moldada e a cueca era de cintura subida e pouco cavada. Nesta década de 60, surgiu também o monokini, peça que era uma adaptação da parte inferior do biquíni mas que expunha totalmente os seios numa abordagem ao topless.

Importa referir que, nos anos 50 e 60, o surgimento de novas fibras sintécticas como a Lycra (uma fibra com ampla elasticidade) ou o Lastex (tecido elástico de latex), vieram contribuir para a qualidade dos tecidos usados na confecção de fatos de banho e biquínis e, sobretudo, eram matérias acessíveis, de secagem rápida e resistentes. Na colecção do museu existem vários exemplares destas peças executados nestas fibras. Porém, a sua característica mais importante era a capacidade de modelagem da silhueta feminina. Estrelas de cinema, como Brigitte Bardot, Marilyn Monroe ou Ursula Andress, surgem de biquíni em filmes de sucesso, tornando-o símbolo de sedução, de liberdade sexual e de emancipação feminina.

Ao longo das décadas de 1970 e 1980, biquíni e fato de banho de uma única peça, co-habitaram nas praias. Houve momentos - sobretudo na década de 80 - em que o fato de banho estava verdadeiramente na moda, sendo multicolor e muito cavado. Popularizou-se com a série televisiva norte americana Baywatch, cujas personagens femininas, das quais se destacava Pamela Anderson, usavam fatos de banho vermelhos, muito cavados e decotados. Estes foram amplamente copiados e marcaram uma geração. Em termos de moda masculina, nesta década, a influência do surf começou alongar os calções de banho que adoptaram a forma de boxers tendo caído em desuso o slip e a tanga, tão característicos da década de 1970.

A partir da década de 1990, a moda dos trajes de banho começa a diversificar-se e surgem no mercado modelos para todos dos gostos. O tankini, muito em voga no final dos anos 90, conjugava o pudor do fato de banho e o aspecto prático do biquíni. A partir dos anos 2000, a tanga, o fio dental e o triquini começam a envadir as praias. Há uma enorme diversidade nos trajes de banho que utilizam na sua confecção materiais leves, frescos, que protegem dos raios solares e que podem inclusive ser antibacterianos. Datam dos anos 2000 os fatos de banho mais actuais do acervo, sendo executados em malha de fibras sintéticas e ilustrando uma grande variedade de padrões e de cores.

Na actualidade, o mercado foi inundado por uma enorme variedade de escolhas em termos de forma e cor de trajes de banho. A moda masculina pouco se alterou desde o anos 80, com os calções de banho a variar apenas no comprimento e nos padrões. Em relação à moda feminina, esta foi sem dúvida a que mais se diversificou. Seja pelo culto do corpo, pela necessidade de exibição ou simplesmente para desfrutar dos prazeres do sol e do mar, o design do traje de banho feminino, nos dias de hoje, é muito diferenciado, existindo opções para todos os tipos de corpos. Recaia a escolha sobre um biquíni, um fato de banho, com ou sem alças, cueca ou calção, o traje de banho atrai consumidores permanentemente, com a vantagem de permitir reduzir ou aumentar o peito e até obter um ventre liso. Mantém-se contudo a premissa de serem confortáveis, esteticamente atractivos e resistentes sendo estas características transversais a todos eles. As combinações são inúmeras e a criatividade também...

Elsa Mangas Ferraz

Este texto não foi escrito ao abrigo do acordo ortográfico.

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